Limite do desconforto
Hoje quero abordar uma das limitações da nossa doença. Uma limitação que provavelmente também se estende às pessoas que têm colite ulcerosa e outras doenças não relacionadas com os intestinos.
Pelo título dá para perceber mais ou menos do que estou a falar, mas deixem-me explicar isto um pouco melhor.
A doença de Crohn impõe uma série de limitações na nossa vida na forma de alimentos que não podemos comer, emoções que não podemos ter e medicamentos que temos de tomar, entre outras. Se pudéssemos ou conseguíssemos controlar estas três coisas, principalmente as duas primeiras, teríamos uma vida normal. Mas o que é uma vida normal sem boa comida? Ou sem emoções? E em que se tem de tomar 10 comprimidos por dia? Até é possível viver sem comer certos alimentos, mas haverá algum humano no mundo que não tenha emoções? Não me parece...
Como é óbvio não podemos ceder à doença, é literalmente impossível. Então comemos em restaurantes com amigos e familiares (em que os menus só têm coisas que nos fazem mal), bebemos álcool, choramos a ver filmes, zangamo-nos com outras pessoas, temos discussões, preocupações e às vezes esquecemo-nos de tomar os comprimidos. E como consequência dessas ações e comportamentos temos dores de barriga e uma série de complicações.
Mesmo com estes problemas temos de continuar a viver a vida e isso implica sair de casa mesmo quando se está com diarreia e/ou dores de barriga. Temos de viver com estes problemas no dia a dia, mas a partir de que momento é que a doença nos para? A partir de que momento é que o desconforto se torna tão grande a ponto de afetar o que estão a fazer? Onde está a linha vermelha que separa o suportável do insuportável?
Reparei que fazia estas conceções à doença há algum tempo. Estou habituado a ir jantar a restaurantes quando estou com dores de barriga, ou a não ir à casa de banho embora esteja com vontade porque estou com outras pessoas e não posso ir para casa, ou porque tenho que fazer algo importante e estou longe de casa e só há casas de banho públicas.
Mas depois há aquelas momentos em que não consigo suportar o desconforto, mesmo não sendo oportuno tenho de parar tudo e ir à casa de banho porque estou com uma vontade impossível de suportar, ou porque estou com imensa comichão naquela zona ou porque não sei se me estou a borrar todo ou é suor. Algumas vezes é só impressão e acabo por ir ao wc sem haver necessidade, daí a pergunta de onde fica a linha que separa a ação da inatividade?
Esta conversa toda porque há uns meses atrás enquanto ia à casa de banho de um centro comercial estava a pensar o quão não normal era a situação em que estava e como a maior parte das pessoas não tem de passar por isso, tendo a doença há 22 anos estou tão habituado a estas coisas que as vejo como normais. Mas não são! Estou tão habituado a viver com desconfortos que só reparo neles quando se tornam insuportáveis.
Alguém já tinha pensado nisto? Também sentem o peso do desconforto?